Entrei na sala, onde se encontrava a minha avó a olhar pela janela com um olhar pensativo.
"Estás a pensar em quê, avó?"
Ela estava tão distante que nem me ouviu. Nem se quer se mexeu quando a minha voz bruta quebrou o silêncio melancólico que preenchia a sala.
"Avó?"
Ela dá um salto e vira-se para mim com cara de espanto.
"Ah, desculpa não te vi. Diz filha, diz."
Eu sorri. Sempre gostei quando ela me tratasse por 'filha'. Pois, tinha um sentido especial. Ela criou-me desde pequena e conhece todo o meu ser de cor, cada célula que me constitui. O meu pai trata-me por filha e a minha mãe também. Pois, são os meus pais e eu sou filha deles. Chamam-me por tal apenas porque sou o resultado da junção dos seus cromossomas. A única digna de me tratar por filha é a minha avó.
"Estavas a pensar em quê?"
Ela desvia o olhar para a janela, onde se encontrava anteriormente.
"Na morte."
"Na morte, avó?"
"Sabes filha, já não sou nova. Tenho mais de 70 anos. Eu penso na morte porque eu sinto-a. Sinto a sua presença espalhada por esta casa. Ás vezes, quando sinto uma dor, por mais pequenina que ela seja, fico com medo. Começo a pensar que já é a minha vez. Nunca sabemos quando é que vamos morrer. Pode ser hoje, amanhã, daqui a duas semanas. Até pode ser daqui a 10 minutos. Como eu sei que o meu tempo está a aproximar-se mas não sei quando precisamente, penso na morte. Penso naquilo que mais me persegue."
Foram estas as palavras que deixaram-me estupefacta. Olhei para a minha avó e pela primeira vez vi uma senhora de 70 anos. Pela primeira vez vi as suas rugas, os seus cabelos brancos e o seu ar cansado. Foi aí que apercebi-me verdadeiramente que a sua morte estava a aproximar-se. Assustei-me. Sempre que olhara para a minha avó, via uma mulher cheia de força, de poder. Bem, sempre vi uma Super Mulher. Já pensei para mim milhares de vezes: "Ela está a ficar mais idosa. Um dia destes... vai morrer." Não quero parecer insensível mas quando pensava assim, não me perturbava muito porque eu já pensava assim desde os 10 anos e a minha mente foi aceitando... Mas hoje perturbou e bastante. Tentei imaginar a minha avó numa caixão. Imóvel, calma, calada... morta. Não consegui. Lágrimas caíram dos meus olhos e revoltada e confusa, fui para o meu quarto.
Não consigo entender. Todos os dias olhamos para pessoas idosas desconhecidas e aceitamos o facto da sua morte estar por perto. Mas quando olhamos para alguém conhecido, para alguém que nós amamos... não conseguimos aceitar. Porquê? Porque é que perturba-nos assim tanto? Estive a pensar o dia todo nisso e nem estou perto de uma resposta. Só sei que agora acho que nunca estive com mais medo de perder alguém.
A resposta está na última frase do teu texto: "Só sei que agora acho que nunca estive com mais medo de perder alguém.", a tristeza de sabermos a existência da morte, é o medo de perda, o medo de aqueles que amamos irem paraum mundo paralelo, onde quem sabe um dia os iremos encontrar.
ResponderEliminaro certo é que talvez aos 10 anos te tenhas apercebido dessa realidade, porque antes , em pequeno, tal como nos filmes deves ter dito ao teu pai, ou mesmo à tua avó, : " Amo-te, não morras nunca, prometes!?" e ao teu espírito, ao teu ser infantil, de criança ingénua mas sentida, responderam que não, para não ficares tristes, que irão ficar para sempre contigo, Apenas passado algum tempo a resposta foi mudando para um :"Filha, todas as pessoas morrem, um dia ou outro, não deves temer isso, é tão natural como a vida, como o nascimento."